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Menções de Isa (Jesus) no Alcorão. Isa (Jesus) Mensageiro de Deus mas não Filho de Deus. Jesus (Isa) não morreu na cruz. Télécharger gratuit Jesus no Alcorão pdf
Jesus no Alcorão
Octavio da Cunha Botelho
Abril/2017
2
Aqueles que nunca leram o Alcorão e
conhecem o Islamismo apenas através dos
noticiários, ao serem informados que Jesus é
mencionado algumas vezes neste livro sagrado
dos muçulmanos, pensarão imediatamente que
todas as menções são hostilidades. Ou alguém
mais informado poderá supor que estas menções
se assemelhariam às narrativas hostis na coleção
de anti-evangelhos conhecida por Sefer Toledoth
Yeshu (Livro da História da Vida de Jesus) dos
judeus, onde Jesus é humilhado e debochado ao
extremo. Porém, ao contrário, no Alcorão, Jesus é
elogiado e reconhecido como um Mensageiro de
Deus (Alá) e chamado de Messias, bem como sua
mãe é elogiada como uma mulher virtuosa. Seus
milagres são admitidos e ele é apontado como um
homem de sabedoria. Entretanto, com uma
diferença crucial com o Cristianismo: Jesus não é
reconhecido como o Filho de Deus, apenas como
um dos Mensageiros de Alá (Deus), que veio
antes de Maomé. Em suma, na leitura das
passagens referentes a Jesus, é possível logo
perceber a clara tentativa de assegurar que Jesus
foi um importante Mensageiro de Alá (Deus), mas
os cristãos alteraram sua mensagem original e
então uma nova revelação, através do Arcanjo
Gabriel para Maomé, foi necessária a fim de
recuperá-la. Esta recuperação inclui a mensagem
original da Bíblia Hebraica, a qual os judeus
3
também deformaram. Os judeus e os cristãos são
denominados no Alcorão de Povos de Livro.
Tal como acontece com as traduções de
quase todos os antigos livros sagrados, as
versões do Alcorão para as línguas
contemporâneas divergem consideravelmente de
uma tradução para a outra. Então, quando não se
domina a língua original do texto religioso, neste
caso o árabe, a solução para resolver as
diferenças nas traduções torna-se ainda mais
difícil. Para este estudo, foram comparadas cerca
de dez versões inglesas de diferentes tradutores 1 ,
algumas tão divergentes da maioria que nem
sequer foram arroladas na bibliografia.
Jesus é conhecido no Alcorão pelo nome
de Isã, algumas vezes através da frase: “Isã ibn
Maryam” (Jesus, filho de Maria), em algumas
passagens: 3:42-59; 4:157-9; 4:171 ; 5:72-5; 5:110-
17 e 19:30-6. Pelo que é dito de Jesus, nota-se
logo que foi extraído de fontes diferentes dos
evangelhos canônicos, bem como divergente de
outros textos apócrifos, apesar de alguns pontos
coincidentes. Maomé não foi capaz de ler os
evangelhos canônicos, pois era analfabeto,
portanto o pouco que aprendeu foi apenas de
ouvido. Enfim, as menções de Jesus no Alcorão
são mais um exemplo de como eram divergentes
as versões sobre Jesus e seus ensinamentos nos
1 A tradução portuguesa do poeta Mansour Challita também
foi consultada.
4
primeiros anos do Cristianismo. Maomé (570-632
e.c.) viveu na atual Arábia Saudita, naquela época
um subúrbio inculto e selvagem do império
bizantino, onde quase toda a população era
analfabeta.
O Analfabetismo de Maomé
Maomé é literalmente chamado de
analfabeto ( ummi) no verso 157 da sura 07 (Al-
A’raf - As Alturas) do Alcorão, através de um
aposto: “Aqueles que seguem o Mensageiro
(Maomé), o analfabeto (ummi), quem eles
encontram mencionado na Torá e nos
Evangelhos...”. Maulana Muhammad Ali explica
que a palavra árabe “ummr significa “aquele que
nem escreve nem lê um texto. Por isso os árabes
são conhecidos como o povo ummf, e o profeta
ummT é quer o profeta do povo ummT (isto é, os
árabes), porque ele era como eles, ou ele era
assim chamado porque ele não sabia ler e
escrever” (Muhammad Ali, 2010: 210; ver também:
Mohar Ali, 2003: 525 e Haleem, 2005: 105). Outra
referência à incapacidade de Maomé de ler e de
escrever aparece na sura 29 ( Al-Ankabut - a
Aranha), verso 48: “Você nunca recitou qualquer
escritura antes que nós te revelamos esta
(escritura, isto é, o Alcorão), você nunca escreveu
2 Provavelmente pelos povos mais cultos da vizinhança
naquela época, ou seja, os gregos, os romanos e o persas.
5
uma (escritura) com a mão direita...” (Haleem,
2005: 255; ver também: Mohar Ali, 2003: 1282 e
Muhammad Ali, 2010: 497).
Entretanto, o intrigante na primeira
revelação corânica é o fato de Maomé ser
analfabeto, porém, milagrosamente, conseguiu ler
o texto apresentado a ele pelo Arcanjo Gabriel
durante uma visão, já que, segundo os registros
preservados nos Hadiths (ditos e atos de Maomé)
e nas biografias, Maomé era iletrado. Segundo o
relato da sua mais antiga biografia, a STrat Rasül
Allãh, de autoria de Muhammad Ibn Ishãq (707-
773 e.c.) 3 , esta primeira revelação aconteceu
quando ele estava dormindo numa caverna no
monte Hira, quando lhe surgiu, através de uma
visão, o Arcanjo Gabriel com uma colcha de
brocado, na qual havia algum escrito e disse:
recite, no que Maomé perguntou: o que eu devo
recitar? Ele não conseguia ler o que estava
escrito, pois era analfabeto. Pela sua pergunta “o
que devo recitar”, percebe-se que o seu
analfabetismo era tão completo que nem sequer
foi capaz de identificar que o que estava sobre a
3 Ibn Warraq descredencia esta biografia com base no fato
de ter sito escrita por volta do ano 750 e.c., portanto mais de
cem anos após a morte de Maomé em 632 e.c., bem como a
obra original está perdida e é só disponível hoje através de
uma recensão tardia de Ibn Hisham, que morreu em 834 e.c.,
ou seja, duzentos anos após a morte de Maomé (Warraq,
1998: 37). Mesmo assim, ela é a biografia de maior
autoridade entre os muçulmanos, ver: Guillaume, 2004.
6
colcha era um texto. O arcanjo insistiu por mais
três vezes e Maomé deu as mesmas respostas
indagando o que deveria recitar, até que ele
finalmente leu o texto e depois acordou do sono
conseguindo conservar na memória tudo que
estava escrito no texto daquela colcha 4
(Guillaume, 2004: 106; ver também: Williams,
1961: 61 e Peters, 1993: 51). Este evento é para
os crentes mulçumanos um exemplo do poder do
que deus é capaz, já para os céticos, mais uma
lenda inventada pela imaginação humana a fim de
exaltar Maomé. A primeira revelação nesta Noite
do Destino está registrada nos cinco primeiros
versos (ayas) da sura 96, denominada Alaq
(Coágulo), no Alcorão, 5 quando Alá ordenou que
Maomé lesse: “Leia ( iqraa ) em nome de teu
Senhor, que criou, criou o homem de um coágulo
de sangue. Leia (/grã). E teu Senhor é o mais
generoso, que ensinou (o uso da) pena...”
(Palmer, 1994, vol. 09: 336; Mohar Ali: 2003: 2004;
Haleem, 2005: 428 e Muhammad Ali, 2010: 784).
Outros tradutores traduziram a palavra /'grã por
4 Intérpretes céticos desta passagem explicam que, o que
Maomé experimentou, naquele momento, foi um surto de
alucinação, ao invés de uma visão mística, tal como entende
a tradição islâmica.
5 Cronologicamente, estes são os primeiros versos do
Alcorão, por isso deveriam estar no início, porém, uma vez
que este texto não segue rigorosamente a ordem cujas
revelações foram ditadas, esta passagem aparece entre uma
das últimas suras (capítulos) do Alcorão.
7
‘recita’ (Arberry, 1955: 344 e Peters, 1994: 51).
Esta diferença na tradução pode ser explicada
pelo fato de que na Antiguidade era comum a
leitura em voz alta, uma vez que a maioria da
população era analfabeta, então quem sabia ler,
lia, quando solicitado, de maneira para os outros
ouvirem. Logo, ler poderia ser sinônimo de recitar.
Agora, a menção da criação do homem a partir de
um coágulo de sangue (alaq), mencionada logo
acima, só pode ser uma alusão poética, de alguém
ou de uma cultura, bem como de uma época, que
não conheciam a origem e o processo de
desenvolvimento da humanidade, por isso a
necessidade então de criar alusões poéticas para
a origem das criaturas que hoje é explicada
cientificamente, pois, do contrário, a afirmação é
cômica. No entanto, a sura 75 (Al-Qiyãmah - A
Ressurreição), versos 37-9, não entende esta
afirmação tão poeticamente assim ao dizer: “Não
era ele (o homem) uma gota de esperma (manJy)
ejaculada? Então, ele era um grudento coágulo
( alaqah ) e Ele (Deus) criou e perfeitamente o
formou. Então, Ele fez dele (do coágulo) o par,
macho e fêmea” (Mohar Ali, 2003: 1918; Haleem,
2005: 400 e Muhammad Ali, 2010: 739). Portanto,
diferente do mito do Antigo Testamento, que
revela a criação do homem a partir do barro e a da
mulher a partir da costela (ou lado) de Adão, o
Alcorão, nesta passagem, apresenta outra versão
mítica, ou seja, a criação do homem e da mulher a
partir de um coágulo {alaqah).
8
O Nascimento de Jesus (/sã)
A Anunciação à Maria no Alcorão coincide
em alguns pontos e diverge em outros com os
evangelhos canônicos e apócrifos, cujo relato
aparece em duas passagens (3:42-7 e 19:16-22).
No primeiro (3:42-7), é um anjo quem faz a
Anunciação: “Maria, Deus (Alá) te escolheu e te
fez pura. Ele realmente te escolheu acima de
todas as mulheres” (Alcorão, 3:16 - Mohar Ali,
2003: 173; Haleem, 2005: 37 e Muhammad Ali,
2010: 79). Na outra versão (19:16-22), foi o
espírito de deus quem anunciou na forma de um
homem perfeito: “Ela (Maria) retirou-se de sua
família para um lugar no Oriente e separou-se
deles por uma cortina. Nós enviamos nosso
espírito a fim de aparecer diante dela na forma de
um homem perfeito” (Alcorão, 19:16-7 - Mohar Ali,
2003: 954; Haleem, 2005: 192 e Muhammad Ali,
2010: 377). Na sura 03 ( Al-lmrãn - A Família de
Imrãn), através de dois versos (45-6) com
traduções divergentes entre os tradutores para a
língua inglesa, a anunciação é feita assim à Maria:
“Os anjos disseram: ‘Maria, Deus dá-lhe as boas
notícias de uma palavra dele - seu nome será
Messias, Isã (Jesus), filho de Maryam (Maria),
estimado neste mundo e no próximo, e será um
daqueles próximos a Deus. E ele falará aos
homens ainda no berço e durante a maturidade, e
ele será virtuoso” (Mohar Ali, 2003: 173; Haleem,
9
2005: 37-8 e Muhammad Ali, 2010: 80). A frase
“ele falará aos homens ainda no berço e durante a
maturidade” é especialmente intrigante. No
primeiro caso, Jesus falará ainda bebê no berço,
um milagre, até certo ponto cômico, que não
aparece nos evangelhos canônicos e somente em
um texto apócrifo 6 . O segundo caso, a palavra
“maturidade” (árabe: kahl) é motivo de
controvérsia entre os tradutores, uma vez que
sinaliza para o fato de que Jesus (/sã) não morreu
na cruz ainda no início de sua idade adulta, mas
viveu até a velhice. Então, a fim de diluírem a
precisão do significado de maturidade, alguns
tradutores traduziram a palavra “kahf’ por “idade
adulta”, o que poderá compreender o início da
idade adulta até o fim da mesma, ou seja, a
velhice. Enquanto que Maulana Muhammad Ali,
diferentemente, traduziu a palavra “kahl’ por
“velhice” (Muhammad Ali, 2010: 80).
O episódio do milagre da fala de Jesus no
berço é desenvolvido em 19:29-33, quando Maria
mostrou a criança recém-nascida (Jsã - Jesus) ao
seu povo. Então, todos ficaram surpresos e
alguém exclamou: “Maria, tu tens trazido algo sem
precedente 7 . Ó irmã de Arão, seu pai não era um
6 Evangelho Árabe da Infância, § 01 (Platt Jr, 1926: 38 e
Botelho, 2015: 82).
7 A tradução da palavra árabe "fany" (sem precedente,
inédito) é controvertida, por isso traduzida com sentidos
diferentes nas traduções consultadas. Utilizei aqui a tradução
de M. Mohar Ali (2003: 957).
10
homem mal, sua mãe não era impura” 8 . Maria
então apontou para a criança (Jesus) em sua
defesa. E eles disseram: “Como poderemos
conversar com uma criança no berço? Mas, Isã
(Jesus) falou: “Eu sou um servo de Alá, Ele me
concedeu a Escritura, Ele fez de mim um profeta e
abençoado. Ele me ordenou que rezasse e doasse
esmola até quando eu viver. E ser obediente com
a minha mãe. Ele não fez de mim um tirano ou um
imoral. A paz estava comigo no dia em que nasci,
estará comigo no dia em que eu morrer e no dia
em que eu renascer à vida novamente” 9 (Mohar
Ali, 2003: 957; Haleem, 2005: 192 e Muhammad
Ali, 2010: 379-80). Este milagre também aparece,
com uma redação diferente, em um evangelho
apócrifo conhecido por Evangelho Árabe da
Infância, § 01 (Platt Jr. 1926: 38 e Botelho, 2015:
82).
O nascimento de Jesus (/sã) narrado no
Alcorão 19:22-60 é diferente da versão canônica
de Lucas 2:04-12. Ao invés de nascer em uma
manjedoura a caminho de Belém, a fim de atender
8 Os intérpretes desta passagem divergem quanto ao fato se
a surpresa do seu povo foi em virtude do anúncio de Maria
de que seu filho era o Messias, portanto uma afronta aos
judeus da época, ou se foi em virtude de ter dado à luz uma
criança sem ter sido tocada.
9 Os intérpretes muçulmanos entendem que esta passagem
não se refere à ressurreição de Jesus após a crucificação,
pois, tal como veremos mais adiante, o Alcorão sustenta que
Jesus não morreu na cruz, mas sim à ressurreição no Dia do
Juízo Final.
11
à convocação do recenseamento, na versão
corânica Maria tinha se retirado para um lugar
distante e deu à luz Jesus junto ao tronco de uma
tamareira, após sentir fortes dores do parto:
“Depois de Maria ter concebido, ela se retirou para
um lugar distante, e quando as dores do parto
conduziram-na a agarrar-se no tronco de uma
tamareira, ela exclamou: ‘Eu preferiria ter morrido
e esquecido tudo isto há muito tempo’, mas, uma
voz falou com ela de baixo: ‘Não se aborreça, seu
Senhor colocou um riacho sob seus pés, e se você
sacudir o tronco da tamareira em sua direção,
cairão tâmaras maduras sobre você, então coma,
beba, alegre-se e diga a alguém que encontrar:
‘Eu prometi ao Senhor da Misericórdia abster-me
da conversa e eu não conversarei hoje’” (Haleem,
2005 : 192 ).
Jesus (/sã), apenas um Mensageiro
O Alcorão reconhece e elogia Jesus (/sã)
como Messias e Mensageiro de Alá, porém não o
reconhece como o Filho de Deus ou como o
próprio Deus: “São infiéis aqueles que dizem: ‘Alá
é o Messias, o filho de Maria’. (Sendo que) o
próprio Messias disse: ‘Filhos de Israel, adorai
Deus, meu Senhor e seu Senhor’. (...) O Messias,
o filho de Maria, foi apenas um mensageiro, outros
mensageiros vieram antes dele; sua mãe foi uma
mulher virtuosa, ambos comeram comida (tal
como os outros mortais). Vê como nós
12
esclarecemos estes sinais a eles (aos cristãos), vê
como eles (os cristãos) estão enganados”
(Alcorão, 05: 72 e 75 - Haleem, 2005: 75).
E mais adiante uma censura ainda mais
severa aos cristãos: “Ó Povo do Livro 10 , não
exceda em sua religião e não diga algo sobre Alá
exceto a verdade. O Messias, (Jesus), o filho de
Maria, foi nada mais do que um Mensageiro de Alá
(Deus), sua palavra, dirigida à Maria, um espírito
Dele. Assim, acredite em Alá e em seus
Mensageiros e não fale de uma Trindade, pare
com isso, será melhor para vocês. Deus é apenas
o único Deus. Ele está muito acima de ter um filho,
tudo nos céus e na Terra pertence a Ele e Ele é o
melhor em quem confiar. O Messias (Jesus) nunca
faria pouco caso de ser (apenas) um servo de
Deus 11 ...” (Alcorão, 4.171-2 - Haleem, 2005: 166 e
Mohar Ali, 2003: 320-1).
Jesus (/sã) não morreu crucificado
Segundo o Alcorão 4:157, Jesus não
morreu na cruz: “Alguns dizem: Matamos o
Messias, Jesus (/sã), o filho de Maria, o
Mensageiro de Deus. (Mas, na realidade) eles não
o mataram, tampouco o crucificaram, embora
pareceu que isto foi feito, aqueles que discordam
sobre ele estão repleto de dúvidas, sem
10 Referência aos cristãos.
11 Elogio à humildade de Jesus.
13
conhecimento, somente suposição; eles
certamente não o mataram” (Haleem, 2005: 65).
Outra alegação é a de que ele não chegou a ser
crucificado (Ahmad, 2003: 57-62), sendo então
substituído por outra pessoa no momento da
crucificação, a qual foi crucificada em seu lugar,
ou também, que ele sobreviveu à crucificação, não
chegando a morrer, mas apenas sofreu um
desmaio (Ahmad, 2003: 17), este último caso é
conhecido como a “hipótese do desmaio”. Então,
em seguida, partiu em viagem para o Oriente,
onde faleceu nestas terras distantes em idade
avançada (Ahmad, 2003: passim), ou até mesmo
que Jesus visitou as regiões orientais tanto na sua
juventude como depois da sobrevivência à
crucificação (Kersten, 2001). Os mórmons
acreditam que Jesus realizou aparições na
América depois da sua morte. Também, na
tradição islâmica, H. M. Ghulam Ahmad
mencionou alguns Hadiths (ditos de Maomé), da
coleção conhecida pelo nome de Kanz-ul-Ummal,
de que Jesus viveu até a idade avançada de 125
anos, viajou por muitas partes do mundo e ficou
conhecido como o “profeta viajante” (Ahrmad,
2003: 62-3). Este autor, que é o fundador do
movimento islâmico reformista Ahrmadiyya Muslim
Jamat, é um dos primeiros e mais ardentes
defensores da tese de que Jesus sobreviveu à
crucificação, viajou para a índia para encontrar as
tribos de Israel e, o que é mais surpreendente, do
argumento de que o profeta Yuz Asaf, sepultado
14
no santuário de Roza Bat, na cidade de Srinagar,
Caxemira, índia, é o próprio Jesus. Ele foi o
principal divulgador desta tradição de Roza Bal,
através do seu livro Misih Hindustan Mein,
publicado em 1908 na língua urdu, depois
publicado em inglês em 1944, com o título de
“Jesus in índia".
O assunto sobre a viagem de Jesus à índia
ganhou interesse internacional a partir de 1887,
quando o jornalista russo Nicolas Notovitch,
durante uma viagem à região do Ladak, no estado
da Caxemira, índia, onde predomina a cultura do
Budismo Tibetano, por isso o Ladak é apelidado
de “Pequeno Tibete”. Após uma fratura na perna,
ele teve de ser assistido por monges do mosteiro
budista de Hemis, nesta região, fato que lhe
obrigou a estender sua permanência. Na ocasião,
ele foi informado da existência de um manuscrito
desconhecido com o nome de “A Vida do Santo
Issa, o Melhor dos Filhos do Homem” guardado na
biblioteca deste mosteiro. Issa é o nome atribuído
a Jesus no Alcorão (3:45 e 5:75). Então, com a
ajuda de um intérprete, anotou as traduções para,
assim, publicá-las depois em Paris com o título de
“La Vie Inconneu de Jésus Chrisf (A Vida
Desconhecida de Jesus Cristo), em 1894. A
edição inglesa apareceu logo em seguida, com o
nome de “The Unknown Life of Jesus Chrisf, em
1895 (Notovitch, 1916: 08-9). O livro, certamente,
provocou um alvoroço no meio intelectual. As
opiniões se dividiram entre os que acreditaram na
15
publicação de Notovitch e os que perceberam nela
uma fraude. O primeiro a contestar foi o então
prestigiado orientalista F. Max Müller, no jornal
inglês The Nineteenth Century, em outubro de
1894, onde ele denunciou a descoberta de
Notovitch como uma fraude, bem como suspeitou
até mesmo da visita deste jornalista russo ao
mosteiro de Hemis no Ladak (Kerster, 2001: 10).
Outro ataque, desta vez de um professor do
Government College de Agra, índia, J. Archibald
Douglas, cuja visita ao Ladak em 1895, o levou a
investigar a autenticidade da descoberta de
Notovitch. Seu relato foi publicado em abril de
1 896 no Orientalischen Bibliografie com o título de
“Documentos provam a fraude de Notovitch”.
Outra publicação do The Nineteenth Century, em
1896, contém a afirmação de J. A. Douglas,
durante sua visita ao mosteiro Hemis, de que o
abade, ao conhecer a publicação de Notovitch,
respondeu que “tudo era mentira” (Kerster, 2001:
11 )-
Em 1956, Edgar J Goodspeed usou o
primeiro capítulo de seu livro Famous Biblical
Hoaxes or Modern Apocrypha (Famosos Boatos
Bíblicos ou Apócrifos Modernos) para demonstrar
a fraude de Nicolas Notovitch. Mais recentemente,
o conhecido e dedicado pesquisador bíblico Bart
D. Ehrman escreveu: “Hoje não há um único
pesquisador reconhecido no planeta que tenha
dúvida sobre a matéria. A história inteira foi
inventada por Notovitch, que ganhou muito
16
dinheiro e uma substancial soma de notoriedade
por seu boato” (Ehrman, 2011: 282-3). Para
James R. Lewis, tudo é uma forja (Lewis, 2003:
79s).
Por outro lado, Nicolas Notovitch teve
defensores, naturalmente da parte dos esoteristas,
dos místicos, e de uma que se autoproclamava
vidente (Kersten, 2001: 01-18; Abhedananda,
1987 e Prophet, 1987: 92-120 respectivamente).
Enfim, somente estas modalidades de pessoas
acreditaram em Notovitch, ou seja, ninguém no
meio acadêmico e científico. O fato é que, o
manuscrito secreto que lhe foi mostrado no
mosteiro, do qual Notovich realizou suas
anotações traduzidas, nunca foi mostrado
publicamente, nem sequer uma cópia, sendo
assim, nunca foi entregue para o escrutínio de
pesquisadores acadêmicos com conhecimento em
Paleografia, em Crítica Textual e em Filologia,
para a avaliação da sua autenticidade, do seu
significado e da sua credibilidade como
documento histórico.
Jesus (/sã) é como Adão
Em uma passagem breve, Jesus (/sã) é
comparado com Adão no Alcorão 3:59: “Aos olhos
de Alá, Isã (Jesus) é como Adão. Ele o criou do
barro, e disse a ele, “seja”, e ele veio à existência”
(Mohar Ali, 2003: 178-9 e Haleem, 2005: 38-9).
Portanto, esta passagem compara Jesus com
17
Adão, ou seja, Jesus foi um homem tal como Adão
e não uma criatura divina. Sendo assim, segundo
a interpretação dos muçulmanos, Jesus não foi
nada mais do que um mortal, pois, quem foi criado
do barro não pode ser uma criatura divina.
Diálogo entre Deus (Alá) e Jesus ( ísã )
Em outra passagem do Alcorão (5.109-17),
Alá reunirá os mensageiros no Dia do Julgamento
e então dirá assim a Jesus (/sã): “Jesus, filho de
Maria, lembra-te de minha graça sobre ti e sobre
sua mãe, quando te protegi com o espírito santo,
de maneira que falaste ao povo no berço e na
maturidade. E quando te ensinei o Livro, a
sabedoria, a Torá e o Evangelho ( /n/77 ), e quando
criastes do barro uma figura de pássaro, com o
seu sopro ela se tornou um pássaro de verdade
com a minha permissão 12 . E quando curaste o
cego de nascença e o leproso com minha
permissão, e ressuscitastes os mortos. E quando
te protegi dos Filhos de Israel, quando
aproximastes deles com as provas e aí eles
disseram que não acreditavam nelas: ‘Isto é nada
mais do que feitiçaria’ (1 1 0).
12 Este foi um milagre efetuado na infância de Jesus que não
é narrado nos evangelhos canônicos, mas é relatado no
Evangelho Árabe da Infância, § 36 (Platt Jr., 1926: 52-3 e
Botelho, 2015: 83).
18
E quando inspirei os discípulos: ‘credes em
mim e no meu Mensageiro’, e eles disseram:
‘cremos, testemunha que somos submissos’ (111).
E quando os discípulos perguntaram: ‘Ó
Jesus, filho de Maria, pode teu Senhor nos enviar
do céu uma mesa servida’? E ele lhes respondeu:
Temei a Deus e sois crentes’ (1 12).
Disseram: ‘Queremos comer dela para que
nossos corações sosseguem e para que saibamos
que nos tens dito a verdade e sejamos
testemunhas dela’ (1 1 3).
E Jesus, filho de Maria, disse: ‘Deus,
Senhor nosso, manda-nos do céu uma mesa
servida que seja uma festa para todos nós do
primeiro ao último e que seja um sinal de ti. E
gratifica-nos: és o melhor dos doadores’ (114).
Respondeu Deus: ‘Farei descer. Quem
dentre vós descrer depois, será submetido a um
castigo, ao qual não submeterei alguém nos
mundos’ (115).
E quando Deus perguntou: ‘Ó Jesus, filho
de Maria 13 , dissestes tu aos homens: ‘Adorem a
mim e a minha mãe, como dois deuses em vez de
um só Deus’? Jesus respondeu: ‘Glorificado seja!
Como diria eu o que não me pertence? Se o
tivesse dito, tu o saberias. Sabes o que está em
13 O Alcorão exagera na repetição da frase: "Jesus, filho de
Maria", enquanto o pai de Jesus não é mencionado em parte
alguma.
19
minha alma, e não sei o que está em Tua alma. És
tu o conhecedor dos invisíveis 14 (1 1 6).
Não lhes 15 disse senão o que me
ordenastes: ‘Adorai Deus, meu Senhor e vosso
Senhor’. E eu era testemunho do que faziam
enquanto vivi entre eles. Quando me chamaste a
Ti, eras Tu que os observava. Pois, és testemunha
de tudo’ 16 (117 - Challita, 2002: 62-3; Mohar Ali,
2003: 384-9; Haleem, 2005: 78-9 e Muhammad
Ali, 2010: 161-3).
Obras utilizadas
ABHEDANANDA, Swami. Journey into Kashmir
and Tibet: with the Life of Jesus by Nicolas
Notovitch. Calcutta: Ramakrishna Vedanta Math,
1987.
AL-AZAMI, Muhammad Mustafa. The History of
the Qur’anic Text: from Revelation to Compilation.
Leicester: UK Islamic Academy, 2003.
ARBERRY, Arthur J. (tr.) The Koran Interpreted.
New York: Macmillan, 1955.
AHMAD, H. M. Ghulam. Jesus in India: Jesus’s
Deliverance from the Cross & Journey to India.
14 A intenção aqui é mostrar que os cristãos deformaram os
ensinamentos originais de Jesus ao pregarem a divindade da
mãe de Jesus.
15 Aos apóstolos e aos seguidores de Jesus.
16 Se esta passagem estiver se referindo a morte de Jesus na
cruz, então estará em contradição com a passagem 4.157, a
qual assegura que Jesus não morreu na cruz.
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